29.10.07

Kairós e chronos

O movimento nascente de cristãos vivia em dois tempos. Enxergava um tempo favorável, o kairós, o tempo de refrigério, aqui e agora, no tempo de restauração, no chronos. Queria fazer alguma coisa para mudar sua situação para melhor, para algo utópico, desencadeando práticas concretas e transformadoras na sociedade. O absurdo de dizer que o tempo oportuno kairótico, isto é, o tempo da plenitude de sentido, poderia ser vivido no tempo presente, no tempo cronológico, repleto de contradições humanas, fez com que os cristãos agissem no hoje como se o amanhã da humanidade deles dependesse.

Aqueles homens e aquelas mulheres acreditavam que estavam antecipando o Reino de Deus. Promoviam tempos de refrigério (ainda não) dentro dos tempos de restauração (). Sua mensagem contemplava as promessas para o futuro e para o presente, vivendo a dialética do Reino de Deus. Eles e elas levavam, pois, esperança na desesperança, antecipando a chegada de dias melhores, ainda que seus dias fossem dos piores.

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22.10.07

A Reforma Radical

No fim deste mês, dia 31, comemoramos 490 anos da Reforma Protestante. Vamos falar um pouco de um grupo reformador cujas idéias foram extremamente radicais.

Dispostos a promover uma reforma dentro da própria Reforma, os reformadores radicais exigiam que se levasse às últimas conseqüências os princípios que haviam dado origem à mudança no cenário religioso do século XVI. Buscando restaurar o cristianismo à sua pureza apostólica — quando não procuravam antecipar a comunidade escatológica —, estes reformadores não possuíam necessariamente uma uniformidade doutrinária, pois além de discordar das opiniões do protestantismo clássico (leia-se principalmente Lutero), discordavam intensamente entre si.

As influências recebidas pelos reformadores radicais foram as idéias humanistas — Erasmo sobretudo —, o misticismo alemão, o milenarismo, o caráter anticlerical bem como o infuso espiritualismo dos inúmeros movimentos religiosos populares da Idade Média, e o acesso às Escrituras no idioma vernáculo. Todos estes elementos formam o pano de fundo ideológico do mundo dentro do qual a reforma protestante radical surgiu. Lutero também foi decisivo para fomentar o movimento, já que abriu caminho para uma compreensão criativa da relação entre Espírito, Igreja e indivíduo. Seu pensamento dava expressão ao caráter profético, carismático, pneumático, místico e pessoal da prática cristã.

No entanto, muitos reformadores radicais se mostraram insatisfeitos com a recusa de Lutero em dissociar experiência interna de fé — ação do Espírito — da mediação externa e visível pela qual ela alcança o fiel — pregação e sacramentos. Temiam que o papa protestante fosse a letra. Para eles, a fé não poderia se aprisionar ao passado, mas se transformar pelo sopro renovador do Espírito. Afinal, o Espírito Santo era interpretado como superior a qualquer registro histórico de suas próprias ações. A Bíblia ou a tradição chegaram a ser consideradas por eles, numa perspectiva extrema, dispensáveis se não comprovassem a experiência religiosa.

Embora esse radicalismo não possa ser aplicado à maioria dos reformadores radicais, os anabatistas, talvez o grupo mais expressivo dos protestantes radicais, se caracterizam por: liberdade em matéria de fé, pluralismo no plano da unidade eclesial ampla, compreensão dos colóquios de reconciliação como uma das notas eclesiais essenciais, rejeição do batismo infantil e representação do martírio como integração — promovida pelo Espírito — dos discípulos no caminho da cruz de Cristo. As principais características do movimento ainda incluem aspectos que não o divergem tanto do protestantismo clássico, mas que o corrigem, como a separação entre Igreja e Estado, os repetidos apelos em prol da liberdade religiosa e da tolerância, e os veementes protestos contra a identificação acrítica da fé cristã com o conformismo sócio-religioso.

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18.10.07

Osso catártico

Mal chego em casa, lembro de domingo, quando conversava com o senhor Geraldo. Homem de mais de oito dezenas de anos, ele foi um dos 200 mil torcedores cujo grito fora silenciado no Maracanã na decisão da Copa do Mundo de 1950. Lá, como se sabe, o Brasil amargou uma das piores derrotas de sua história, perdendo em casa por 2 a 1 de seu vizinho Uruguai. Esse osso na garganta incomoda até hoje.

Incomodava. Agorinha mesmo ele foi arrancado, pelo menos da minha. A seleção verde-e-amarelo não deixou os mais de 80 mil exaltados brasileiros, balançando as bandeirinhas de plástico à toa. Verdade seja dita: estava todo mundo com medo de voltar para casa arrependido de ter pagado ingresso para manter o tal do histórico osso futebolístico goela adentro. Ainda bem que não foi assim.

As famigeradas vaias que Lula ouviu no mesmo lugar do jogo foram convertidas em aplausos para os cinco gols marcados pelos arrancadores de osso mais famosos e bem pagos do mundo. O Equador foi a vítima mais disposta a estragar a catarse do já arquetípico osso. Pressionou o tempo todo. Só parou quando se viu no ridículo de ouvir “olé” cada vez que os jogadores brasileiros tocavam a bola. Afinal, o osso tinha de ser jogado em alguma garganta, que, não fosse na uruguaia numa final de Copa do Mundo, pelo menos seria na primeira que se candidatasse a engoli-lo. O goleiro, coitado, ficou até com a dívida de levar do Maracanã, que já foi o maior estádio do mundo, não apenas um osso de lembrança, mas também um frango.

Mas, vocês me dão licença, porque minha garganta precisa descansar depois de agüentar tanto tempo um osso que ora se torna catártico.

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13.10.07

Criação e evolução


Criação e evolução são conceitos complementares e interligados na explicação teológica sobre a origem do universo. A criação está presente na evolução, porque a evolução não pode ser explicada somente a partir de si. A evolução, por sua vez, é inerente à criação, já que o mundo foi criado com vistas a transcender a si mesmo.

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5.10.07

O dia que vi o mar

Uma página do livro da minha vida se chama Copacabana. Este era também o nome do ônibus dentro do qual entrei disposto a chegar a algum lugar que tivesse a tão famosa água salgada. Ao sentir a brisa da maresia, percebi que este era apenas um detalhe a mais que se juntaria aos pés descalços na areia, ao camarão frito, à pele bronzeada e à sombrinha em plena alta temperatura da cidade. “Cidade Maravilhosa!”, exclamei dentro de mim, com a certeza de que o nome Rio, dali em diante, significaria um pouco mais além do estigma de lugar mais perigoso do país. Estava ali, mas o mundo estava logo ali, para além daquele horizonte azul. “Mundo, mundo, vasto mundo”. Drummond certamente não disse isso pensando em Itabira. Itabira? Era apenas “uma fotografia na parede”. Como não poderia deixar de ser? Qualquer Itabira diante daquele mundo de água seria relegada a ficar pendurada na parede da memória.

A Avenida Atlântica, que só conhecia no Banco Imobiliário, agora não passava de um obstáculo de quatro pistas para se chegar à praia. Uma estátua daquele poeta conterrâneo, cravada no calçadão da orla, me fez sentir em casa. Bom seria mesmo que aquele lugar fosse a minha casa. Morar diante daquela imensidão anil, cuja semelhança com o céu da minha terra provocou em mim o esquecimento de que um dia ela fora privada de ter seu próprio mar, seria o sonho de qualquer pessoa com consciência de sua condição humana. Sabe aquele sentimento de que a gente nasce, cresce e morre? Diante do mar isso não existe. A eternidade mora ali, no infinito, no oceano. Naquele lugar, onde se esquece de que a vida está de costas para ali. Deve ser por isso que o cidadão mais ilustre da minha cidade foi morrer de frente para aquelas águas. Ele nunca morreu. Lá está até hoje! Se eu tivesse de escolher um lugar para morrer... Ah, deixa isso pra lá!

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2.10.07

Quem é esse?

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