20.2.09

Filosofia – insegurança, poesia e inutilidade

A filosofia não responde a nada, pois está em sua gênese perguntar. Por isso, esta disciplina, mais do que qualquer área do saber, está ligada à crítica. Sua criticidade, no entanto, tem a ver mais com a paixão do que com o controle do saber. Na verdade, aqui não há aporia, já que a filosofia suporta a convivência de paixão e razão. Ainda assim, é preciso pensar mais na possibilidade do risco do que da segurança, pois estamos falando de lugares que não são seguros.

Afinal, o que é saber? A própria tradução de filosofia como “amor pelo saber” merece consideração cuidadosa. Os radicais gregos “filos” e “sofia” poderiam significar outra coisa também. Lembremos que “filos” é, antes de tudo, “aquilo que é próprio”. Por sua vez, a palavra “sofia”, na sua origem, dizia respeito ao saber do poeta, portanto, a um saber específico, diferente de qualquer saber. Nada melhor que a expressão “o que é próprio do poeta” para definir o significado de filosofia.

Sendo a filosofia o saber do poeta, filosofar está entre as atividades mais “sem lenço e sem documento” do planeta. Aliás, não queiramos encontrar utilidade nas artes. Não cabe à arte o labor de triunfar. Se há um triunfo para o artista, este é, segundo Fernando Pessoa, “quando ao ler suas obras o leitor prefere tê-las e não as ler”. Este é seu maior triunfo. Isolar os outros, incitando-lhes o desejo de estarem sós. A arte impõe a obrigação de estar isolado. Como isso é verdade para quem mergulha na arte filosófica de encarar as questões mais profundas de nossa existência!


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12.2.09

José, para onde?

Dia desses, minha cidade natal foi notícia de capa da Folha (1º/2/2009). Fiquei triste. Afinal, não era dia 31/10, aniversário de seu mais ilustre filho, Carlos Drummond de Andrade. De coisa boa não se tratava mesmo, pois reportava-se que até o Carnaval fora cancelado este ano na minha terra tão querida. As más novas informavam acerca da ameaça de desemprego por causa da tal crise econômica.

Sinceramente, espero que Itabira — que significa "pedra que brilha" — não passe de "apenas uma fotografia na parede" para a Vale na hora de tomar decisões que podem afetar 70% da economia desse município. Vale lembrar que é de lá que essa imponente companhia extrai o minério que já encheu seus cofres nos tempos de bonança, transformando em buraco o maior patrimônio natural da cidade que é o Pico do Cauê, de onde, como diz a lenda, se podia ver Belo Horizonte, que está a mais de 100km de distância. Nessas horas, fico me perguntando, como todo bom itabirano, "E agora, José?". Do lado de lá, do lado dos poderosos, de quem vale, alguém deve matutar: "José, para onde?". (Por favor, não digam o óbvio — "Rua!")

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5.2.09

Animismo

Há muito preconceito com tudo o que vem da África. Não seria diferente com as religiões vivas daquele lugar que é o berço da humanidade. Por isso mesmo, quero falar sobre animismo, uma das tendências religiosas mais comuns nessa região. Aliás, esta palavra vem de “anima”, que significa “alma”. Talvez haja poucas tradições que levem tão a sério esta que constitui o princípio da vida.

Para os animistas, há alma em todos os seres vivos, objetos inanimados e fenômenos naturais. Este princípio vital é revelado pela presença dos “espíritos”, aqueles que animam tudo o que existe. Afinal, Ruhanga, o criador do mundo, apesar de bom, está distante, sendo necessária a presença espiritual para proteger a saúde do povo e permitir boas colheitas.

Cabe aos espíritos, sobretudo dos que já morreram, o papel de velar por aqueles que ainda respiram o ar. Eles controlam a moral e a ética das pessoas, pois se forem más, podem vir a ser castigadas com catástrofes e doenças.

A oralidade é muito importante. O “livro sagrado” é contado de pai para filho. Sabem aquelas historinhas que todos nós ouvimos quando pequenos? Então, para eles, trata-se de um ritual santo. Um sarau acontece em volta da fogueira a cada noite. A arte está mui presente não apenas neste artifício da fala, mas também nas festas, onde artistas plásticos fabricam máscaras para representar os espíritos invisíveis.

Para mim, a fé animista ensina que, antes de tudo, antes mesmo de nós existirmos, “o espírito [já] se movia sobre a face das águas”, como tenho aprendido com o Gênesis desde que me entendo por gente.

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