15.6.07

Pastoral às avessas

Fã infantil do primeiro testamento do conjunto de livros sagrados cristãos, vez ou outra me pego lendo a obra mais pastoral de todas em minha opinião, chamada Eclesiastes. O capítulo 3 deste aporético livro contém uma seqüência de coisas difíceis de se entender, incluindo um eterno adágio: “tudo tem o seu tempo”. Não entendo o chorar, muito menos o rir. Mas lá está escrito que há tempo tanto para aquele como para este. É verdade! Hoje eu me vi no abismo dos dois verbos.

Ao fazer meu primeiro funeral como novel pastor, à tarde, li que há tempo de estar calado, bem como há tempo de falar. Obviamente, o silêncio foi a mensagem. Não queria dizer nada além de uma ausência de discurso. Espera-se, no entanto, que um ministro religioso use a sua língua nestas horas. Usei. Não mais que 5 minutos, sendo um de solene silêncio. Jamais esquecerei daquelas reticências. “Quando as respostas se transformam em perguntas, quando as certezas se transformam em incertezas, quando a alegria se transforma em tristeza, quando o riso se transforma em choro”...

À noite, porém, saboreava uma garfada de strogonoff de carne em uma festa de aniversário de alguém da igreja. Falar era o mais importante. Futebol foi o assunto. Risadas aos montes. Reticente me senti apenas na hora de ir embora. Em boa hora!

Voltando para casa, agorinha, pelas ruas frias e vazias da Tijuca, lembrava-me daquilo que mamãe me disse quando criança: “chore com os que choram, alegre com os que se alegram”. Confesso: continuo sem compreender!

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14 Comentário(s):

  • At 15 de junho de 2007 às 09:30, Blogger Alysson Amorim said…

    Camarada,

    É de arrepiar. Chamaria isto de malabarismo divino. Chorar e rir, mas não apenas nos lábios. Chorar e rir na alma, em um mesmo dia, eis um mistério realmente incompreensível. É daquelas tarefas que só podem ser realizadas se colhermos energia do alto, da graça divina.

    Uma vida empática exige isto (e o ministério pastoral, suponho, não existe sem aquela abertura completa e incondicional ao outro, a empatia).

    É preciso chorar e depois rir. Falar de eternidade e depois de futebol. Enterrar e depois sentir a alegria da árvore, no vento.

    Me lembrou uma poesia do Ferreira Gullar, escrita por ocasião da morte da Clarice Lispector. Permita-me transcrevê-la:

    Morte de Clarice Lispector

    Enquanto te enterravam no cemitério judeu
    do Caju
    (e o clarão de teu olhar soterrado
    resistindo ainda)
    o táxi corria comigo à borda da Lagoa
    na direção de Botafogo
    as pedras e as nuvens e as árvores
    no vento
    mostravam alegremente
    que não dependem de nós.

    Abração.

     
  • At 15 de junho de 2007 às 10:03, Blogger Andreia said…

    Pois, às vezes é dificil sorrir quando se sente tristeza...

     
  • At 15 de junho de 2007 às 13:01, Blogger Fá menor said…

    É bem verdade, há um tempo para tudo!

    Deve-se ter um tempo para tudo e cada coisa a seu tempo!

    Bjitos

    Fa-

     
  • At 15 de junho de 2007 às 18:12, Anonymous Anônimo said…

    tua mãe tinha (ou ainda tem) uma sabedoria que merece meu aplauso!



    abraços, flores, estrelas..

     
  • At 16 de junho de 2007 às 14:27, Blogger Elsa Sequeira said…

    Meu Querido Felipe!!!

    Como em cada palavra deste texto eu vi o teu lindo coração desembrulhando-se, revelando-se...na dor...no silêncio...na alegria...em todos os esses momentos...eu vi o que existe nesse coração lindooo - AMOR - AMOR - AMOR !!

    Amei o teu post!!

    Beijinhos!!!

    ps - por lá hoje tenho algo bem diferente... - coração de pedra...

     
  • At 16 de junho de 2007 às 17:43, Blogger Janete Cardoso said…

    Você é um amigo pra todas as horas!
    Louvo à Deus, por permitir que entre tantas pessoas, justamente você, faça parte da minha vida, mesmo que virtual!
    Beijo!

     
  • At 16 de junho de 2007 às 17:46, Blogger DE-PROPOSITO said…

    “chore com os que choram, alegre com os que se alegram”.
    .............
    Uma verdade sensata. Qualquer pessoa num local onde impere a tristeza, não se vai por a rir`. Já os que são 'diminuídos mentais' o poderão fazer. E acontece.
    Já o choro é um pouco diferente. No meio de uma grande festa, uma pessoa que receba uma notícia triste pode ficar a chorar.
    No caso contrário, num funeral por exemplo, uma pessoa mesmo que receba uma notícia alegre, não se põe às gargalhadas.
    O comportamento dos seres humanos, são um pouco complexos. E estão relacionados com os padrões de cultura de cada um.
    ............
    Obrigado pelas amáveis palavras deixadas no meu blogue.
    Um abraço.
    Manuel

     
  • At 18 de junho de 2007 às 16:42, Blogger DCG said…

    OOPS, esbarrei neste blog teopoético, já q estou aki deixo um recado, belas palavras, ou melhor, belo silencio, este que preenche o momento tornando-o eterno... rogo ao Pai que num futuro não tão próximo, quando eu e você estivermos contando nossa primeira centena de funerais não comecemos a falar d+, pensando que está em nós as palavras...

    PS: Axo que domingo de manhã tu fez um comentário sobre o silêncio não foi? VIu? Axa que só durmo no culto? tbém ouço alguma coisa...rsrsrsrs

     
  • At 20 de junho de 2007 às 08:08, Blogger RP: Man of the house said…

    Amigo Filipe,

    Deve ser difícil lidar com uma situação dessas.
    O sentimento de saudade, de tristeza, de vazio e às vezes até de revolta das pessoas que participam num funeral determinam que se use poucas palavras e dessas apenas as "certas" (isto é muito relativo).

    Muitas vezes sinto que o melhor a fazer numa ocasião dessas é relembrar a pessoa e manter um silêncio profundo de quem tem amizade e carinho e de quem acredita que algo virá depois desta vida por cá neste planeta minúsculo.

    "A compreensão daquilo que o ser humano necessita vem da compreensão que temos do que é um ser humano nas suas múltiplas vertentes". Não sou eu que o digo mas algumas correntes da psicologia.

    Um abraço com Deus

     
  • At 20 de junho de 2007 às 08:11, Anonymous Anônimo said…

    Oi mano Felipe,
    Obrigado por comentar no blog.
    A vida nos ensina a calar ou falar.
    Geralmente, no sofrimento o melhor a fazer é a presença, só isso.
    Abraço,

     
  • At 20 de junho de 2007 às 13:27, Blogger alealb said…

    o tempo de cada coisa...
    é preciso pedir sabedoria a Deus para lidar com isso.
    gostei do post.
    beijos,
    alê

     
  • At 21 de junho de 2007 às 11:35, Blogger Felipe Fanuel said…

    Não posso deixar de dar as boas vindas aos visitantes (tá parecendo igreja... deve ser a ordenação! hahaha): Fa menor, Davi (dcg) e Alê (alealb).

    Sejam sempre bem-vindos!

     
  • At 24 de junho de 2007 às 09:36, Blogger Marlene Maravilha said…

    Tudo isso faz parte da sabedoria divina! Sim, há tempo realmente para tudo nesta nossa vida, e pode ser quase no mesmo momento! Gosto deste livro!
    Parabéns pelo pastorado! Que haja forças e sabedoria pela vida afora!
    beijo

     
  • At 28 de junho de 2007 às 10:40, Blogger Felipe Fanuel said…

    Marlene,

    Suas palavras são sempre especiais.

    Obrigado pelos votos!

     

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