4.1.07

Lições simples para um 2007 de sucesso

O temor do Senhor é o princípio do conhecimento; mas os insensatos desprezam a sabedoria e a instrução. (Pv 1,7)


INTRODUÇÃO
Nesta transição de final para início de ano, é comum refletirmos sobre os erros e acertos do ano que se passou, visando planejar um futuro ano melhor. Existe uma ansiedade em torno desta avaliação, uma vez que a preocupação não está relacionada ao presente, isto é, ao agora, mas aos 12 meses que estão à porta, como uma espécie de desafio a ser vencido. Ou seja, uma das nossas grandes preocupações iniciais do ano é simplesmente ter consciência de que se está vivendo um novo ano.

Neste ambiente de dúvidas e incertezas, salta aos olhos o desejo de descobrir a fórmula do sucesso, isto é, aquilo que pode afastar-nos dos medos que cercam o dia-a-dia de todos nós, porque todos nós planejamos o futuro, aquilo que pretendemos ser, fazer e realizar. Embora esta seja uma questão pessoal, a sociedade também cobra de cada indivíduo uma postura diante deste futuro, transferindo um peso maior para uma ansiedade que já é pessoal. [Quantos jovens não são perguntados sobre a faculdade que pretendem cursar, a profissão que vão seguir – de preferência uma que lhe renda um bom dinheiro? Quantas pessoas não são questionadas sobre suas decisões sentimentais, se vão casar ou não?, etc.]

Assim, diante do medo do novo, cuja definição aparenta-nos obscura, afinal ninguém sabe o que está por vir, resta-nos assumir a inutilidade de sonhar com um amanhã de sucessos. E ter sucesso é entendido como ser o primeiro, estar sempre à frente, isto é, no topo do pódio, jamais no segundo lugar, passando em cima de tudo para atingir os objetivos e metas estabelecidas em meio à tensão entre o medo do incerto e as pressões pessoais e sociais para se definir no amanhã, e não no hoje. Mas, será que a vida é só vencer? Será que realização é sinônimo de número 1?

Pois bem, pretendemos refletir sobre isso a partir da partícula de um texto, o qual compõe um bloco de textos instrutivos à vida, porém estes não devem ser vistos como regras para se viver, pois a instrução aqui é mais do que uma imposição ou sugestão, mas uma radiografia da pura realidade da vida. Alguém está querendo mostrar como a vida realmente é, doa em quem doer. Esta é a razão destes escritos serem denominados por sapienciais, pois estão relacionados à sabedoria humana frente ao desafio de viver.

Estamos diante de um dos textos mais centrais e decisivos na compreensão da antiga sabedoria hebraica. O motivo dessa importância talvez se deva ao fato de o autor sacro fazer uso de termos encontrados majoritariamente na literatura deste gênero. São termos sempre lembrados ao longo do discurso proverbial.

Antes de analisar cada termo e desenvolver nossa reflexão sobre estes, vamos considerar a intenção que o texto pretende trilhar no universo de Provérbios e tentar acessar os fatores contextuais, cujo pano de fundo ajusta nossa lente a fim de enxergarmos um pouco mais daquilo que enxergamos normalmente.

É possível sentir, no antigo contexto da sabedoria hebraica, uma preocupação em colher frutos da experiência vivida, ou seja, é muito mais do que refletir sobre a vida, mas sim se posicionar diante dos resultados dela. Portanto, enquanto ser que pensa, o homem não vai deixar ser levado pelo momento, mas vai tomar em suas mãos o seu destino para descobrir, em meio às confusões e perigos da vida, a rota certa de um caminho que ele já está seguindo. Saber viver é o descobrir-se dentro deste caminho e buscar no próprio caminho as respostas para as perguntas e indagações que vêm à tona ao longo da vida.

É daí, da vida prática, que vão nascer os provérbios; porque Provérbios querem mostrar que a vida que pergunta é a mesma vida que responde, na medida em que vida prática é o simples ato de respirar, acordar, alimentar e andar, isto é, o simples ato de viver.

Por isso, a preocupação não está em preceitos ou definições religiosas, mas em uma simples e profunda devoção "humana" a Deus, através da vida cotidiana. Aqui vemos um Deus não distante do ser humano e de sua vida, mas um Deus que se revelou, se revela e se revelará nas simples coisas da vida, naquilo em que os olhos humanos insistem em se fecharem para ver.


1. O TEMOR
Analisando no texto, em primeiro lugar, a palavra temor, alcançamos um sentido mais valorizado, por este expressar um sentido mais íntimo e pessoal, isto é, diz respeito ao meu interior, e não exterior. Talvez a melhor maneira de tocar no sentido da palavra temor seja perguntarmos intimamente sobre o significado de Deus para cada um de nós. O que Deus significa para mim?

Só eu e você podemos responder a essa pergunta para nós mesmos e para ninguém mais, por ser esta uma resposta pessoal. Há um risco de cairmos na superficialidade ao definir temor simplesmente como adoração ou reverência, pois adoração é o resultado da nossa vida prática, do nosso cotidiano. Temor aqui não significa medo, mas o reconhecimento profundo de que Deus é Deus.

1.1. O temor do Senhor
A expressão que procede temor é do Senhor, e aqui o que nos resta é calar diante desta sentença, do inefável significado que traz o nome traduzido por Senhor. O silêncio expressa o que caracteriza o resultado de temor, pois a verdadeira adoração é o resultado da nossa vida prática, a qual configura o significado deste ser infinito, quem está além até mesmo das palavras humanas. Assim, temor só é temor quando significa se calar, e o se calar é o se prostrar diante do Senhor para viver a vida que ele nos deu, tal como o pássaro se prostra para viver a vida de pássaro, e não de peixe, tal como a flor se prostra ao ser flor, e não árvore.


2. O PRINCÍPIO
Princípio é o começo, é o início, enfim, é o primeiro passo, por isso é o nosso melhor, as nossas primícias. É o que de melhor nós temos nas nossas experiências de vida, porque é algo que está marcado e nada pode tirar.

2.1. O princípio do conhecimento
O princípio marca, por ser este a base de toda construção, sendo aqui a base de conhecimento, saber, sabedoria. Estes termos indicam o sentido de reconhecimento, de habilidade. Seria a experiência de vida na sua essência, isto é, o resultado, o alcançar. Poderíamos até dizer que este é o resultado de nosso caminho trilhado sabiamente, pois aqui está expresso eu e você lá na frente, no futuro, onde construímos, no passado, o que viveremos lá. O futuro aqui não parece ser uma projeção a se alcançar, mas uma realidade palpável, cuja vivência depende de nós mesmos.


3. OS INSENSATOS
Mas existe uma incógnita, ou seja, um desconhecido ponto determinante que pode ser importante na solução de um problema. É o termo insensato, louco, tolo. É o despreocupar-se com os resultados da vida prática, pois insensatos são aqueles que não querem viver como Deus os fez, querem ser tudo menos seres humanos. Todavia, não pensemos nós que este termo refere-se a terceiros, pois este é um adjetivo substantivado, o que denota um estado de ser ou um diagnóstico que pode acometer a mim e a você. É como se fosse um buraco aberto no caminho da vida, onde sempre há uma possibilidade de cairmos, ou não.

3.1. Os insensatos desprezam a sabedoria
Na qualidade de insensatos desprezamos as pérolas da vida. Uma delas é a sabedoria, que aqui não é somente uma habilidade, mas uma habilidade técnica, isto é, uma habilidade a se adquirir. Diferente do resultado, este é o como chegar lá, pois a voz da vida denuncia que viver não é só visualizar a realidade — essência —, mas buscar interagir com a própria vida — forma —, ou seja, chorar quando as lágrimas vierem, sorrir quando a alegria brotar, ser triste e ser feliz; esta é a dinâmica da vida. Em resumo, a sabedoria é um discernimento crítico, uma capacidade de percebermos profundamente a realidade e as situações que nos levam a orientar a nossa vida.

3.2. Os insensatos desprezam a sabedoria e a instrução
Atrelada à sabedoria está a instrução, disciplina. Aqui está a nossa segunda grande falha como insensatos. A instrução é a correção ou advertência aos nossos erros, porque só se corrige o que está errado. Todos nós erramos, porém o maior problema parece não ser o errar, mas a postura diante dos erros. Instrução não é procurar os erros e acertos, e sim é o processo de se autocriticar, isto é, uma correção que visa à educação. Esta é uma instrução pessoal e não de terceiros. Como insensatos, podemos instruir ao mundo inteiro, mas sempre falhamos em instruir a nós mesmos.


CONCLUSÃO
Por fim, nesta reflexão, poderíamos aprender, com os sentidos destes termos, que olhar para um 2007 de sucesso é olhar primeiramente para o 2007 atual, o qual estamos vivendo, isto é, o hoje, o agora. Aí, descobrimos as lições simples para a vida atual, uma vez que, se o temor do Senhor é o me calar diante daquilo que ele significa para mim, podemos estar certos de que ele nos fez para viver a vida hoje, pois o amanhã só a ele pertence, no amanhã só nos resta calar. Este é o primeiro passo para um ano entregue à realidade em que estamos inseridos, seja qual for, e este é o nosso melhor, pois é o que nos faz sentir o chão em que pisamos, a nossa realidade.

Ainda que em alguns momentos despreocupemos com os resultados da vida, lembremo-nos sempre de que esta incógnita pode ser revertida em uma atenção à vida como ela de fato é, sabendo que a autocrítica é a melhor ferramenta para um crescimento cauteloso e sadio. Pois ter sucesso, muitas vezes, não é só vencer a vida, mas é simplesmente saber vivê-la. E que Deus nos ajude!

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